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25.04.2023

Maior seletividade na admissão de terceiros interessados no Cade

A partir de um estudo exclusivo sobre a admissão de terceiros em atos de concentração no Cade, nosso escritório concluiu que o número de rejeições teve um crescimento de 40% nos últimos três anos.

A Superintendência-Geral (SG) do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) passou a rejeitar com maior frequência o ingresso de terceiros interessados em atos de concentração. O objetivo é limitar interferências desnecessárias à instrução, preservando a eficiência e a celeridade da análise de fusões e aquisições cuja implementação só pode ocorrer após a aprovação pela autoridade concorrencial.

De acordo com o procedimento do Cade, é facultado a terceiros impugnar um ato de concentração no prazo de 15 dias a partir da sua divulgação oficial pelo Conselho. O requerimento deve ser fundamentado, devendo, em essência, demonstrar a legitimidade do requerente e os efeitos anticoncorrenciais da operação. Uma vez admitido, o terceiro passa a poder contribuir mais ativamente com a análise da operação sob controle e recorrer ao Tribunal do CADE contra a aprovação do ato pela SG.

Como a fonte primária de informações sobre uma operação sujeita a controle pelo Cade são as próprias partes interessadas na sua aprovação, é intuitiva a importância de se permitir a oposição fundamentada por clientes, fornecedores e concorrentes potencialmente afetados. A possibilidade de recurso ao Tribunal do Cade pelo terceiro é também coerente com o desenho institucional do órgão. A aprovação monocrática da operação pela SG pode ser levada por recurso do terceiro à deliberação colegiada do Tribunal do Cade, permitido o reexame do mérito da operação. Por outro lado, a parcialidade inerente aos posicionamentos de terceiros pode afetar a utilidade das informações para instrução do caso e atrasar injustificadamente a sua conclusão, recomendando cautela na sua admissão formal no procedimento.

Revertendo tendência anterior de admissão quase invariável de terceiros, a SG passou a ser mais seletiva. Em 2020 e 2021, houve apenas 1 e 2 indeferimentos, tendo sido admitidas 22 e 30 impugnações, respectivamente. Já em 2022, a SG rejeitou 10 e deferiu 21 impugnações, determinando a apresentação de comprovação adicional das alegações em 9 desses pedidos acolhidos para admissão definitiva. Em 2023, houve, até o momento, um deferimento e uma rejeição.

As rejeições têm sido motivadas principalmente na avaliação mais criteriosa da utilidade da contribuição de terceiros para análise do mérito das operações. Em caso recente, a SG indeferiu requerimento por entender que a demonstração da legitimidade não foi atendida simplesmente pelo terceiro ser cliente ou concorrente, sendo indispensável a demonstração objetiva de efeitos concorrenciais negativos sobre os seus interesses individuais. Em outro precedente, a SG admitiu precariamente terceiro exigindo a apresentação de subsídios complementares corroborando as alegações sob pena de indeferimento.

Esse aumento de rigor parte da percepção de que as contribuições de terceiros frequentemente não agregavam elementos decisivos para análise e acabavam por gerar atrasos prejudiciais à sua conclusão. A admissão mais permissiva de terceiros ocasionava, ainda, maior número de recursos ao Tribunal em face das decisões de aprovação da SG, apenas excepcionalmente resultando na alteração da conclusão da análise.

O maior rigor na admissão de terceiros recomenda esforços redobrados na preparação de impugnações, com demonstração robusta sobre os temas centrais da análise estrutural, tais como divergência quanto ao mercado definido, o nível de concentração, integrações verticais preocupantes, assim como o impacto nas condições de rivalidade e ingresso no mercado, entre outros. O prazo exíguo de 15 dias previsto no procedimento torna ainda mais difícil a tarefa, mas a SG tem permitido a complementação das objeções iniciais em prazo adicional de 15 dias.

A inadmissão como interessado não impede, porém, que os terceiros forneçam subsídios e considerações a qualquer momento durante a instrução processual pela SG. Além disso, terceiros inadmitidos podem apresentar ao Tribunal do Cade suas considerações sobre os potenciais efeitos anticoncorrenciais do ato de concentração, visando à avocação de ofício do caso para julgamento. Em precedente recente, a manifestação de terceiros inadmitidos pela SG foi mencionada como motivação de avocação de ofício para revisão pelo Tribunal da aprovação de operação. Contudo, a atuação do terceiro nesses moldes perde em efetividade, uma vez que podem ser simplesmente desconsideradas pela autoridade.

A agilidade do controle prévio de concentrações é indispensável para a sustentabilidade do regime e para se evitar prejuízos maiores o interesse público. Assim, é positiva a maior seletividade na admissibilidade de terceiros consistente em exigir demonstração sólida de utilidade da sua contribuição para a defesa da concorrência.

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