Publicações

22.11.2023

A inversão dinâmica do ônus da prova e a tutela do direito ambiental

A inversão do ônus da prova em ações de degradação ambiental não é um tema novo e, inclusive, já foi objeto da Súmula nº 618 do STJ. Contudo, quando colocada em prática, essa inversão frequentemente desrespeita os parâmetros previstos no art. 373 do CPC.

A inversão do ônus da prova em ações de degradação ambiental não é um tema novo e, inclusive, já foi objeto da Súmula nº 618 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Contudo, quando colocada em prática, essa inversão frequentemente desrespeita os parâmetros previstos no art. 373 do Código de Processo Civil (CPC).

Esse dispositivo estabelece como pressupostos cumulativos para a inversão do ônus da prova: (i) demonstração objetiva e concreta da excessiva dificuldade concreta e objetivamente comprovada por parte do autor em produzir a prova, acompanhada da maior facilidade do réu em obtê-la; e (ii) a vedação da probatio diabolica, que ocorre quando o destinatário do ônus da prova não possui meios de produzir as evidências necessárias.

A aplicação prática dessa regra, em observância à súmula do STJ, reiteradamente não atende aos requisitos mencionados. Isso ocorre porque, mesmo nas demandas que tratam sobre a responsabilidade civil por danos supostamente causados ao meio ambiente, a regra geral ainda é a de que o ônus probatório da existência do dano e do nexo de causalidade cabe ao autor da ação (CPC, art. 373, I). Afinal, o reconhecimento da responsabilidade depende da efetiva demonstração desses elementos. Por outro lado, quando se aplica a Súmula nº 618, que permite a inversão do ônus probatório em ações de degradação ambiental, há uma tendência por parte dos juízes de presumir que o réu, como suposto poluidor, necessariamente detêm provas relevantes.

Em muitos casos, porém, essa premissa não corresponde à realidade factual e simplesmente desconsidera a previsão legal do próprio CPC, tal como observado em precedentes do e. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP)[1]. As decisões desses recursos são exemplos de situações em que os requisitos não foram devidamente considerados, uma vez que o art. 373 do CPC nem sequer foi mencionado, e as alegações do autor, tidas como plausíveis, foram suficientes para aplicar a súmula do STJ, sem que houvesse uma análise sobre qual parte que teria condições de produzir a prova com menos dificuldades.

Na busca do julgador por uma solução jurídica para os problemas que lhe são apresentados, é fundamental, portanto, que se realize uma análise casuística para determinar qual das partes está em melhores condições de suportar o ônus probatório e, somente quando necessário diante do caso concreto, optar pela aplicação (ou não) da Súmula nº 618, respeitando a disposição legal do art. 373 do CPC.

[1] TJSP. Agravo de Instrumento nº 2233422-16.2021.8.26.0000, Rel. Des. Nogueira Diefenthaler, 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, j.: 17/04/2022; TJSP. Agravo de Instrumento nº 2101125-11.2022.8.26.0000, Rel. Des. Marcelo Martins Berthe, 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, j.: 27/10/2022.

Relacionadas

10.07.2023
Artigos

Pela primeira vez, União Europeia investiga self-preferencing como conduta autônoma

As práticas das grandes empresas de tecnologia (big techs) continuam sob olhar atento das autoridades antitruste […]

29.04.2024
Artigos

Resolução ANTT: Regras para Dispute Boards em contratos de concessão

A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) acaba de aprovar a Resolução nº 6.040/2024 disciplinando a […]

Marchini Botelho Caselta Advogados

R. Senador César Lacerda Vergueiro 380 | 17º andar
Vila Madalena | 05435-010 | São Paulo SP